26.12.06

9.12.06

Não estou triste

Gostava de estar contente.
É como estar a dormir num quarto escuro enquanto lá fora o fogo-de-artifício explode bem lá no alto. É como estar a dormir num quarto enquanto os outros estão todos acordados lá fora, a olhar lá bem para o alto.

(É este não arriscar que me faz pensar que a vida que tenho não é vida)
Acho que tenho medo de te conquistar porque no fundo tenho medo de te perder.

16.11.06

A espera corrói-me até aos ossos.

E, no entanto, que posso eu fazer senão continuar à espera?

21.10.06

O que me faz falta

O que me faz falta é correr e cair de cansaço nas voltas de um baloiço de brinquedo no parapeito de uma janela aberta sobre os estilhaços de cristal brilhantes no fundo de uma caneca larga com sabor a mentol de frescura matinal de um Outono chuvoso debaixo do cobertor quente que canta ao vento a doce melodia da manteiga a derreter no pão de cada dia da semana do mês de todos os anos.

O que me faz falta, és tu.

13.10.06

a Mudança

A mudança é mudança. Não há mudança para melhor nem para pior. Há, simplesmente, mudança. Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades. Que grande chatice se não houvesse mudança. Eu sei que a mudança pode causar receio. Mas a mudança não é boa nem má. É, simplesmente, mudança. E que bom que há mudança. Que bom que podemos mudar. Nem para melhor nem para pior. Simplesmente, mudar.

23.9.06

O tempo não gosta de mim. O tempo corre e não me deixa agarrá-lo. Ou será que sou eu que corro do tempo? Eu não corro do tempo. O tempo é que não me quer agarrar. O tempo não gosta de mim.

19.9.06

o Arrependimento

E quando sentimos aquele vazio, aquela sensação de que algo ficou por terminar. Dói sabermos que queríamos voltar atrás para mudar o que foi feito, mas simplesmente não podemos porque o tempo caminha em frente.
Comigo ficará para sempre o adeus que ficou por dar.

24.8.06

Quando me quiseres encontrar, não me procures.
Porque eu não sou quem sou, nunca estou onde estou.

8.8.06

Quando eu morrer, por favor, não me chorem. Eu não sou assim tão importante. Ou, pelo menos, não me chorem muito. Eu não mereço assim tanto. Podem chorar-me no dia da cremação, mas espalhem quanto antes as minhas cinzas no campo do esquecimento. Não me recordem nunca mais. Ou talvez podem recordar-me unicamente nas datas em que faço anos de nascer e de morrer. Mas, por favor, não me chorem. Para quê chorar por quem já morreu? Não sou nem nunca fui assim tão importante.
A um morto nada se recusa, e eu não quero por nada ser muito chorado.

5.8.06

Passa a mão pelo meu cabelo.
Beija-me.
Deixa-me sem fôlego.
Respira-me.
Há muito que eu deixei de ser meu.
Há muito que eu sou só teu.

31.7.06

Talvez

amanhã ao acordar não sinta o peso de estar só
erga a cabeça e vista aquela roupa já esgaçada de tanto uso, mas de que tanto gosto
pegue nas chaves que estão na mesinha das fotografias e saia de casa para o sol brilhante da manhã
caminhe durante longo tempo e aprecie as ruas menos concorridas da cidade, aquelas onde há árvores grandes e portas e janelas antigas e paredes com azulejos cor-de-mar e erva por entre as pedras da calçada
acabe o passeio num qualquer miradouro de onde possa ver toda a cidade a meus pés

amanhã acorde com vontade de não me queixar tanto
amanhã seja eu próprio

27.7.06

o Pessimismo (inspirado nas palavras da lilima)

Se pudesse escolher, não te tinha como companheiro de viagem. Se pudesse escolher, não te trataria, tão familiarmente, por tu.

Infelizmente, não se trata de uma escolha. Da mesma maneira que nasci com olhos castanhos, nasci igualmente com o pessimismo agarrado a mim.

Infelizmente não é uma escolha.

19.7.06

Não tenho razões para ser triste.
Não tenho razões para ser pessimista.
Não tenho razões para ser infeliz.

E, no entanto, sou-o.

18.7.06

Cada vez me é mais difícil suportar esta insustentável existência do não-ser.

30.6.06

Eu não me devia importar. O problema é que me importo.
Eu não devia ligar. O problema é que ligo.
Eu devia continuar a caminhar de cabeça erguida. O problema é que não consigo.

Não é que não queira. Não consigo.

29.5.06

a Inércia

É como quando acordamos depois de uma noite de bebedeira. A boca está pastosa e só apetece beber algo fresco. O chão ainda não está bem debaixo dos nossos pés. A cabeça fica com o dobro do peso. A euforia passageira da noite anterior acabou, esfumou-se em menos de nada, nas três horas mal dormidas. Sentamo-nos no último degrau da escada e vemos a vida passar por nós. É a inércia, o querer fazer tudo e acabar por não fazer nada. Ali no degrau esperamos. Esperamos. Esperamos. Esperamos.
Até acordarmos outra vez de uma noite de bebedeira, com a boca pastosa, sem chão debaixo dos pés, com a cabeça pesada, sem euforia nenhuma.

26.5.06

No fundo do bolso das calças

Eu quero escrever até a mão me doer. Amanhã não estou cá. E se abrir a porta e o vento me soprar na cara? Que devo fazer com tudo o que não guardei no bolso? Talvez devesse gritar. Talvez não devesse fazer nada. Mas que digo eu? Se calhar devia saltar. Sempre que sinto aquele vento, um papel voa pelo ar. Não. Não conseguiria. Mas arrependo-me sempre por não seguir aquele vento que derruba e faz cair. Arrependo-me sempre de guardar as coisas erradas no bolso. Vou partir e espero não me arrepender. Talvez não doa como à partida parece. Não é que não deva fazer. Só que não sei como fazer. Deixo a oportunidade passar por mim, mas às vezes não me arrependo. É por isso que eu vejo a não vontade de não fazer nada. Talvez se eu saltasse. Ou se desta vez guardasse o que realmente interessa no bolso. Talvez sim. Ou talvez não. Quem é que um dia disse que era fácil atirar uma pedra ao rio? Quem é que disse que tudo tem de fazer sentido? Acho que fui eu. São as frases que guardo no bolso.

9.5.06

Eu, os outros

Por vezes, deambulo pelas ruas da cidade, sozinho e, no entanto, acompanhado dos outros. Os outros? Quem são os outros? Eu sou os outros. Eu diluo-me na multidão que sobe as escadas do metro, na estação terminal da ilusão. Eu misturo-me na massa cinzentona que desagua nas pedras da calçada, pisadas e repisadas por sapatos velhos, e que quer apanhar, sem demoras, o autocarro da anomia. Ninguém me conhece. Eu não conheço ninguém. As caras e as mãos são-me estranhas. Encosto-me à estátua sentada e fico à espera de nada. Vejo os outros passarem por mim, de olhos postos no chão. É a vida invernosa da cidade que dura o ano todo. Também eu vou acabar por erguer-me e andar, de olhos postos no chão. Não há nada de novo aqui e eu, como os outros, vou tropeçar naquele degrau em que todos tropeçam. Eu não sou mais do que os outros. E continuo a deambular sozinho.

4.5.06

Quatro do Cinco

Falo-te daqui da casa vazia da minha tristeza. Os meus olhos estão quentes. Sabes que nunca chorei por ninguém? Não gasto as minhas lágrimas assim tão facilmente.
A saudade aperta e gostava muito que regressasses. Que te sentasses bem junto de mim para eu te poder abraçar. Gostava de te cantar aquela música que por brincadeira te cantava e que era só tua. Lembras-te?
A saudade aperta, mas sei que não podes regressar.
Aceito-o. Estou em paz. Tu continuas aqui comigo.

Sempre e para sempre.

29.4.06

a Simplicidade

Estava eu sentado à espera de nada numa das ruas da cidade movimentada num dia de Primavera, quando alguém se dirigiu a mim querendo, com a voz cansada pelo tabaco, vender-me uma Cais acabada de sair da tipografia.
- Peço desculpa. Não tenho dinheiro. Ainda sou estudante e não tenho mesada nem outra fonte de rendimento.
- Ah, o problema das massas, não é? Olhe, eu é que agora não tenho dinheiro aqui comigo, senão teria todo o gosto em ajudá-lo.

Agora que penso nisto, julgo que aquela voz cansada e simples me ajudou mais do que aquilo que pensa.

21.4.06

Eurydice

Por ti
cortava a mão direita
arrancava os dois olhos
era capaz de matar
era capaz de morrer

Escolhe

15.4.06

a conclusão

Eu ando à procura. Não perco um único momento sequer. Mas agora que olho para trás, consigo compreender que foi tudo uma perda de tempo. Por que é que não me fechaste logo com a porta na cara? Por que razão demoraste tanto tempo a mostrar aquilo que és? Por que me enganaste durante este tempo todo com aquilo que eu pensei seres? Não tenho pena que tenha acabado. Tenho é pena que tenha acabado assim. Agora compreendo que foi uma perda de tempo e isso deixa-me furioso. Pensava poder contar contigo. Mas parece que me enganei. Se queres saber, nem me importo. O que já foi, já foi. Só fico furioso é porque chego à conclusão de que foi tudo uma perda de tempo.

8.4.06

Não sei para onde vou

Sinto que não pertenço a lugar nenhum. Estou perdido.

Não é fácil caminhar quando não sabemos para onde nos dirigimos.

4.4.06

É importante não a deixar escapar

O que fazer com ela? (É importante não a deixar escapar)
Escreve-a num pedaço de papel. (Não a deixes escapar)
Sem ensaios prévios. Sem rascunhos. Sem vergonhas. (Não a deixes escapar tal qual nasceu)
Enfia-a dentro de um sobrescrito. (É importante não a deixar escapar)
Envia-a. (Não vá ela, entretanto, escapar)
Aguarda que chegue ao destino. (É importante não a deixar escapar)

a Ideia.

31.3.06

Auto-análise momentânea

escrever ler gostar amar desejar gritar telefonar apagar destruir rasgar dobrar fotografar apreciar afiar acender apagar olhar ver perceber espreitar brincar rir sorrir ter dar querer mostrar provar ouvir escutar sentir cheirar abrir fechar abraçar correr apertar desenhar tocar beijar pintar cantar perder ganhar ser fugir pensar caminhar andar acrescentar dividir falar conversar dizer perguntar conhecer fazer entrar sair cumprimentar defender esquecer lembrar chorar encontrar unir descobrir descalçar começar terminar mentir adivinhar fingir esconder sonegar misturar deixar parar iniciar acabar trincar pegar cortar seguir ligar beber cair levantar procurar desistir

29.3.06

nada nasce do nada

- Estás esquisito. O que se passa contigo?
- Não sei. Talvez o problema seja mesmo não se passar nada.
- E o que fazes tu para que se passe alguma coisa?
- Nada.
- Trovador... nada nasce do nada...

17.3.06

ela encontra-me no caminho
ela abraça-me
ela embala-me quando quero dormir
ela embala-me e consigo dormir
ela dança comigo uma dança cadenciada
ela é o pão meu de cada dia
ela sou eu, és tu, é ele
somos nós, sois vós, são eles
ela é a minha pedra filosofal
o elixir da longa vida, a panaceia universal

14.3.06

Estou cansado. Estou gasto. Estou farto.
Para mim o mundo já não é novidade.

Não.

Não lhe chamem pessimismo. Não é pessimismo.

É desilusão.

7.3.06

Pára

Tenho pena, mas é assim que sou.
Pára.
Pára de me puxar pelo braço. Pára de me fazer rasteiras. Pára de me gritar aos ouvidos. Pára de me fazer perguntas.
Pára.
Não sei responder e por isso encolho os ombros. Não tenho a resposta a todas as perguntas do mundo. E não as quero ter.
Pára.
Não sei quem sou, mas não quero ser quem tu queres que eu seja. Deixa-me seguir em paz. O caminho não leva a lado nenhum, mas eu quero seguir em paz.

2.2.06

Quando era pequeno
julgava poder ir à lua.

Quando era pequeno
pensava que o mundo de antigamente era a preto-e-branco.

Quando era pequeno
queria casar-me com uma sereia.

Quando era pequeno
achava que podia comer todo o chocolate do mundo.

Quando era pequeno.

Agora já não sou pequeno
Perdi a capacidade de sonhar?

27.1.06

O que é?

é poder falar de tudo
é poder falar de nada
é não dizer nada e mesmo assim não ser embaraço
é caminhar sem sentido pelas ruas da cidade
é saber o que se procura
é saber o que se vai encontrar
é ficar à espera
é não poder esperar mais
é um abraço apertado que não acaba
é cantar na rua sem medo de ser ouvido
é correr de mão dada e não olhar para trás
é estender a mão quando se cai
é aceitar a mão que é estendida
é aceitar como se é
é aceitar o que se quer ser
é rir por tudo
é sorrir por nada

O que é?

19.1.06

Vi-te a dançar ao longe

Vi-te a dançar ao longe
Com uma saia rodada.
Dançavas despreocupadamente
Como quem não dá por nada.

Dançavas a dança do amor
E ao longe eu contigo rodava.
Lentamente levantavas a saia
Ao longe, sabias, eu olhava.

Fui-me aproximando devagar
Da tua dança de sedução
Até chegar ao pé de ti
E ao pé de ti te pegar na mão.

Pedi-te para tirares a saia
Nunca soubeste dizer que não.
Tu tiraste a tua saia.
E amámo-nos no chão.

11.1.06

Na areia de umas obras
Deixei as minhas pegadas.

(Sorrio)

A vida é feita de nadas.